Planejamento Sucessório e suas ferramentas jurídicas

A transmissão dos bens dos pais para os filhos pode ser regulada, ainda em vida pelos pais. O conjunto de ferramentas jurídicas utilizadas, com o objetivo de realizar a partilha do patrimônio em vida, dá-se o nome de planejamento sucessório.

Para Pablo Arruda o planejamento consiste em “providências multi e interdisciplinares que objetivam organizar o patrimônio ou uma atividade empresária para a futura sucessão, ou a efetiva sucessão antecipada em vida, tendo como princípios a manutenção do poder político do acervo e a colheita de seus frutos por quem detém o patrimônio a ser organizado, tudo com a melhor tributação possível dentro de uma segurança jurídica”.

Para concluir um planejamento da forma correta, é necessário utilizar e interligar um conjunto de providências de diversas ferramentas, como a utilização de Holding Patrimonial, com doação, com testamento e com seguro, por exemplo. Em apenas um planejamento sucessório, várias ferramentas foram utilizadas.

A prévia estruturação do patrimônio familiar é medida que se releva manifestamente útil na forma em que adequar corretamente a divisão da herança familiar, preservando, assim, os herdeiros de possíveis conflitos familiares. Nesse sentido, evita-se, inclusive, a lentidão dos inventários e as despesas deles decorrentes, que sabemos que duram mais de 10 (dez) anos para serem concluídos, gerando desgaste econômico e emocional para os herdeiros.

A idealização precoce da sucessão faculta ao seu autor a proteção do patrimônio a ser herdado, evitando sua dilapidação ou mesmo a sua indesejada atribuição a terceiros estranhos ao vinculo familiar.

O planejamento sucessório possibilita a família vantagens tributárias atuais e futuras, tanto quanto aos impostos pagos hoje pela pessoa física (Imposto de Renda), como os impostos que incidem na transmissão no patrimônio (ITCMD). Em que pese a economia tributária ser um grande benefício a ser considerado, não pode ser o primeiro núcleo, é um rebote à sucessão. É raro uma holding bem elaborada que não gera economia tributária para a família.

Cumpre salientar que não se deve falar em menor tributação e sim melhor tributação. Há casos em que a menor tributação não é a mais segura, por esse motivo deve haver um equilíbrio entre economia tributária e segurança jurídica.

É possível regulamentar a administração dos bens e empresas, proteger o patrimônio de eventuais credores, manter a harmonia familiar e o principal, dar continuidade dos negócios e preservar as atividades empresariais desenvolvidas pelos pais. Após a constituição do planejamento, também é possível que o planejador ainda tenha poder político e segurança da receita financeira sobre esse acervo patrimonial enquanto vivo for.

Há uma diferença na sucessão de um patrimônio imobilizado, como bens imóveis urbanos e rurais, veículos e uma empresa. A sucessão empresarial busca identificar a diferença entre meros herdeiros e os verdadeiros sucessores. Não pode confundir herdeiro e sucessor. O herdeiro vai somente receber seus bens, por sua vez o sucessor é aquele que recebendo a empresa tem a capacidade de prosseguir o negócio da mesma forma que o seu sucessor, gerando tranquilidade financeira e psicológica para a família.

Enfim, podemos afirmar que o planejamento sucessório resulta em economia de tempo e dinheiro para as famílias.

Quais são as principais ferramentas utilizadas?

Com o objetivo de afastar as dúvidas sobre a destinação dos bens entre os herdeiros, algumas ferramentas são utilizadas, como por exemplo a doação, o testamento, a Holding Patrimonial e o seguro de vida.

  1. Doação: Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, de forma voluntária, transfere de seu patrimônio, bens ou vantagens para o patrimônio de outra pessoa, sem nenhuma contraprestação. Conforme expõe o Código Civil, a doação deve ser feita por escrito, por instrumento público ou particular, a não ser que se trata de bens móveis e de pequeno valor, neste caso podem ser doados de forma verbal. Caso o bem for imóvel e tiver valor superior a 30 salários mínimos é obrigatório o instrumento público.

Caso a doação for realizada em vida para herdeiros necessários (filhos, pais e cônjuge), podem ser realizadas a título de:

i. Antecipação de herança – neste caso deve ser informada no inventário para que seja deduzida da herança do herdeiro que recebeu;

ii. Dispensa de colação – a doação não precisa ser informada no inventário e não será deduzida da herança do herdeiro. Porém, deve estar expressa no instrumento, caso contrário a doação será considerada antecipação de herança.

A doação traz algumas vantagens á família, como afastar a possibilidade de litígio entre os herdeiros após a morte do doador, pois os bens doados deixam o patrimônio do doador e passam a ser dos herdeiros. Esses bens não farão parte do processo de inventário e, em princípio, é eliminada a discussão entre os herdeiros. Além de que a doação possibilita atribuir determinados bens a herdeiros específicos, bem como a proteção do patrimônio, pois caso ocorrer riscos nos negócios do doador, os bens estarão protegidos com seus herdeiros. Pode ser que a doação obtenha vantagem tributária, mas há outros meios mais vantajosos para a família, pois a base de cálculo da doação é o valor venal do imóvel na data em que for doado.

  1. Testamento: É um ato de manifestação de última vontade de uma pessoa acerca do destino de seus bens e de assuntos de caráter não patrimonial. É um ato personalíssimo e revogável pelo qual alguém, em conformidade com a lei, dispõe e faz estipulação no todo ou em parte, do seu patrimônio para depois de sua morte. Pode ser utilizado em conjunto com outras ferramentas, pois não se trata somente da possibilidade de disposição do patrimônio, também pode ser utilizado para o estabelecimento de regras de vontade do destinador quanto da partilha de seu patrimônio. Pode ser utilizado para:

i. Distribuir o patrimônio pós falecimento. Só podendo testar sobre 50% de seu patrimônio, correspondente a sua parte disponível;

ii. Pode destinar um percentual ou bens específicos para determinado herdeiro;

iii. Nomear tutor ou curador especial para administrar os bens de herdeiros com menos de 18 anos;

iv. Nomear inventariante para seu processo de inventário;

v. Impor cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade, incomunicabilidade, reserva de usufruto e dispensa de colação.

No testamento não incide ITCMD até a abertura da sucessão, que, obrigatoriamente será judicial. A economia tributária com o testamento pode ser mínima, posto que os impostos serão calculados somente após o falecimento do testador. Porém, pode ser utilizado em conjunto com outras ferramentas para dispor sobre as últimas vontades do testador.

  1. Holding Patrimonial: Creio que seja o meio mais utilizado quando tratamos de Planejamento Sucessório. A Holding é uma empresa que tem o objetivo específico de deter bens e direitos, o que pode incluir bens imóveis rurais e urbanos, participação em outras empresas, veículos, aeronaves, investimentos, etc. Há alguns tipos de holding, como a Holding Patrimonial que é aquela que tem como objetivo concentrar bens que possam ser geradores de renda, sendo parte desse tipo a Holding Imobiliária que é utilizada para compra e venda de bens e locação com o objetivo de obter benefícios tributários e também a Holding Rural onde os bens rurais e seus rendimentos fazem parte. Entendemos que todos os tipos são familiares, pois será um ambiente adequado para discussão e tomada de decisões do âmbito familiar e impedindo que eventuais desavenças entre os herdeiros ponham em risco o bom andamento das empresas operacionais.

É necessário escolher um tipo societário para a empresa. A sociedade limitada normalmente é a mais utilizada em razão da facilidade para a sua criação e administração, sendo possível incluir herdeiros no quadro societário e firmar acordo de sócios para expor as diretrizes familiares na próxima geração.

A sociedade limitada é utilizada em conjunto com o regime tributário do lucro presumido, onde é possível obter uma grande vantagem tributária sem seus rendimentos.

Após constituir a empresa, integralizar os imóveis em seu capital social, as quotas são transmitidas para os herdeiros. Ademais, na doação das quotas aos herdeiros, é possível que o doador permita reservar para si o usufruto de direitos políticos (voto) e econômicos (rendimentos), ou seja, somente a nua-propriedade das quotas são transferidas aos herdeiros, mas o doador mantem para si todos os direitos que mantinha antes da doação, podendo eleger quem administrará a empresa, tomar todas as decisões e continuar recebendo seus rendimentos até o seu falecimento.

Também é possível que o doador conste cláusulas de inalienabilidade, incomunicabilidade e impenhorabilidade na doação das quotas aos herdeiros, protegendo o patrimônio integralizado.

E, após o falecimento, como as quotas já estarão transmitidas aos herdeiros, não será necessário inventário dos bens integralizados à Holding e as questões sobre administração, lucro, pro-labore, entre outras, já estarão definidas no acordo de sócios.

Desta forma, a Holding pode trazer maior proteção contra credores, redução da carga tributária sobre aluguéis e venda de imóveis, possível redução do ITCMD, custas processuais, celeridade e honorários advocatícios face ao inventário.

  1. Seguro de vida e Previdência Privada: Saindo dos instrumentos contratuais e empresariais, o seguro de vida e previdência privada são instrumentos financeiros que oferecem oportunidades interessantes no planejamento sucessório.

i. Seguro de vida: é um contrato de seguro, onde o segurador se obrigada, mediante o pagamento de um prêmio estipulado, a garantir o interesse do segurado contra riscos predeterminados. O seguro é pago no falecimento de quem recai o seguro. É importante frisar que é possível contratar mais de um seguro sobre a mesma vida em diferentes companhias.

ii. Previdência Privada: Os mais utilizados são os de previdência aberta, oferecidos por instituições financeiras. O VGBL (Vida Gerador de Benefícios Livres) e o PGBL (Plano Gerador de Benefícios Livres), são planos que possuem um período de acumulação de recursos após o qual se inicia o período de recebimento de renda. O pagamento pode ser mensal ou mediante pagamento único.

Tais recursos podem ser utilizados para satisfazer financeiramente os herdeiros após o falecimento dos pais, para que a surpresa do evento morte não prejudique financeiramente a renda da família. Outra forma de utilização pode ser que o prêmio seja utilizado para arcar com as despesas do inventário. Lembrando que no caso de utilização dessa ferramenta, não evita o inventário e possíveis litígios familiares. Porém pode ser utilizado em conjunto com outra ferramenta.

Essa é uma breve síntese sobre o planejamento sucessório e algumas ferramentas que são utilizadas para proteger a família. Ainda há ferramentas utilizadas para o planejamento patrimonial e sucessório com bens no exterior, como utilização de offshores, smart funds, trusts, entre outros.

Engana-se quem pensa que somente famílias muito ricas, com milhões em patrimônio podem utilizar o planejamento sucessório. Quem tenha patrimônio e pretende protege-lo ou planejar ainda em vida como será feita a transmissão aos herdeiros já é motivo para iniciar o estudo de viabilidade de planejamento.

Falar sobre sucessão, sobre morte, não deve ser evitado. Não falar no assunto não resolve o problema. A postergação ou a omissão em enfrentar possíveis problemas que saberá que vai ocorrer na família, pode trazer problemas ainda maiores, que comprometerão a paz, a harmonia familiar, o conforto e, principalmente, o patrimônio que seria deixado àqueles que nos sobrevivem e que tanto queremos bem.

Gabriel Pavesi – Advogado – OAB/PR 72.007

Vasconcelos e Pavesi Advogados Associados

Comment
Name
Email