A sucessão de Gugu Liberato: quando mesmo com planejamento antecipado, os problemas aparecem

O caso em tela gerou grande proporção no cenário nacional, pois trata-se de um ícone da televisão brasileira. Antonio Augusto Moraes Liberato, mais conhecido como Gugu, faleceu em 21 de novembro de 2019, em virtude de um acidente doméstico em sua residência em Orlando, nos Estados Unidos.

Ao contrário da maior parte das pessoas, o famoso apresentador se preocupou com a sua sucessão patrimonial. Em março de 2011, redigiu o testamento em conjunto com seus advogados dispondo sobre suas vontades quando viesse a óbito.

O documento distribuiu a herança da seguinte forma: 75% para os filhos (João Augusto 18 anos, e as gêmeas Sofia e Marina de 16) e 25% para os cinco sobrinhos. O documento assegura a Maria do Céu, de 90 anos, mãe do apresentador, uma espécie de pensão vitalícia de 163 mil reais mensais.

Na produção do documento, um fato chamou bastante atenção. O apresentador dispôs de 100% dos seus bens e não incluiu sua companheira Rose Mirian Di Matteo, mãe de seus três filhos.

A primeira dúvida que surgiu quanto ao testamento foi: o testador pode dispor de 100% dos seus bens? De acordo com o parágrafo primeiro do artigo 1.857 do Código Civil, não pode. Só é possível dispor de 50% de seus bens, a legítima dos herdeiros não pode ser incluída no testamento.

Após a assinatura do testamento, Gugu e Rose Mirian assinaram um contrato denominado “compromisso conjunto para a criação de filhos”, no qual estabeleceram questões quanto a visitas, residências  e definições sobre o pagamento das despesas mensais dos filhos.

Cumpre salientar que o contrato assinado pelas partes tinha como objetivo afastar a união estável existente entre Gugu e Rose Mirian, visto que sua cláusula 11 aduzia: “o pai e a mãe das crianças, nada tendo a reclamar um do outro pela deliberação de ambos em terem os seus filhos ou a qualquer outro título, declaram-se plenamente satisfeitos, cada qual mantendo e conservando, idoladamente, sem qualquer participação ou ingerência do outro, os seus próprios bens”.

Claramente, nesta época, já havia preocupação quanto a união estável do casal, posto que tratam sobre a disposição dos bens, os quais não haveria comunicação, mantendo-se idolados um do outro.

Um ponto importante é questionar se havia união estável entre Gugu e Rose Mirian. Conforme exposto no artigo 1723 do Código Civil: “é reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência públicacontínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.”

No presente caso, havia convivência pública? Sim, foram capas de inúmeras revistas de celebridades e tiveram aparições públicas na TV, inclusive em seu programa dominical.

A convivência era contínua e duradoura? Sim, não é necessário saber o marco inicial do casal, posto que o filho mais velho completou 18 anos e, desde então, há publicidade da união e em nenhum momento foi ventilado o término ou rompimento da união.

Havia o objetivo de constituição de família? Notório que sim, residiam juntos com os 3 filhos em Orlando-EUA e em todas as entrevistas e matérias publicadas sempre foram denominados como família.

Quanto aos deveres e direitos dos conviventes, o artigo 1.724 do Código Civil aduz que “as relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos”.

Ser leal é corresponder à confiança do parceiro, abrange um dever de respeito e de consideração devida mutualmente entre os companheiros, em um propósito de perpetuarem a sua relação afetiva. O dever de assistência é recíproco entre os conviventes, no ponto de vista do socorro material e espiritual. A guarda, sustento e educação dos filhos é tarefa dos pais na união estável, variando apenas a custódia física da prole em razão da coabitação dos genitores.

Havia lealdade, respeito e assistência entre os companheiros? Sim, pelo que consta nos autos e depoimentos até agora, não havia uma relação vulnerável entre as partes, o respeito era predominante. Porém, houve o ingresso de um homem no inventário alegando ser companheiro de Gugu, o que, até o momento, não foi provado.

Quanto a guarda, sustento e educação dos filhos, é público que o apresentador morava com os filhos em Orlando, sustentava financeiramente a família e colabroava assiduamente com a educação deles com sua companheira.

Desta forma, o contrato assinado pelas partes em maio de 2013 com o objetivo de afastar a união estável do casal não é juridicamente válido, posto que todos os requisitos, deveres e direitos da união foram respeitados.

Caso a união estável entre Gugu e Rose Miriam seja decretada pelo Magistrado, como deverá ficar a sucessão do falecido? Metade dos bens adquiridos durante a união do casal deverá ficar com Rose Miriam e o restante dividido entre os herdeiros legítimos e o testamento. Como assim? Entenda:

50% – Rose Miriam;
25% – 3 filhos (João Augusto, Sofia e Marina);
25% – Testamento.

Mas e os bens particulares do apresentador, adquiridos antes da união estável com Rose Miriam? Deverão respeitar o exposto no testamento, de forma que 50% seguem com os herdeiros legatários, quais sejam, seus filhos e os outros 50% restantes deverão ser partilhados conforme o testamento.

Assim, a declaração de última vontade do apresentador respeitaria a legítima e respeitaria a companheira, tornando o testamento válido.

Data: 23/04/2020

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